
Apostas unidas: o Brasil caminha para a sindicalização do setor?
A abertura oficial do mercado regulado em 1º de janeiro de 2025 acelerou tudo: licenças federais e estaduais avançaram, receitas cresceram, e o setor saiu da zona cinzenta. Nesse ambiente em expansão, empresas de apostas esportivas on-line com atuação em São Paulo convocaram a criação do Sindibets/SP como frente organizada.
A assembleia de 31 de julho de 2025 (capital paulista) será exclusiva para operadoras registradas no estado e foca em estatuto, representação e diálogo regulatório. A movimentação ecoou entre marcas ligadas também a cassinos online brasileiros, que veem no sindicato um mecanismo para defender interesses técnicos num cenário de normas em rápida mudança.
O passo paulista levantou uma tese maior: por que parar no estadual? Já circula nos bastidores a ideia de uma federação nacional apelidada de “Febrabet” para centralizar pautas tributárias, publicidade e combate a ilegais junto ao governo federal. Se vingar, o setor deixa de reagir isolado e passa a disputar espaço político organizado.
Um ponto de inflexão está à vista: arrecadação bilionária, regulação densa e disputa de mercado forçam coordenação coletiva. O Sindibets/SP pode ser o início de uma arquitetura representativa em camadas – estados na base, federação no topo – dando voz estruturada às empresas licenciadas.
Brasil em jogo: como se formou o cenário regulatório atual
A Portaria nº 827/2024 da Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA/MF) definiu o arcabouço: outorga de R$30 milhões válida por 5 anos, até 3 marcas por licença, exigência de empresa domiciliada no país com 20% de capital brasileiro e prazo de regularização até 31 de dezembro de 2024.
No lançamento regulado, 81 autorizações foram publicadas (15 definitivas, 66 provisórias). Após análise documental e certificações, o número de licenças permanentes chegou a 37 no início de 2025; projeções do setor apontam faixa futura de 43 a 68 operadores ativos, contando migrações de provisórias.
Operar legalmente implica obrigações: domínio “.bet.br”, verificação de CPF e reconhecimento facial, proibição de crédito ao jogador, prevenção à lavagem e integridade de dados esportivos. Laboratórios como a BMM foram credenciados para certificação técnica; sem laudos, não há autorização plena.
Enquanto o nível federal regula apostas de quota fixa nacionais, estados (Rio de Janeiro, Paraná, Paraíba, Maranhão e outros) estruturam loterias e concessões regionais com taxas menores (R$2 mi–R$5 mi) e escopo local. A discussão fiscal esquenta: proposta de elevar o imposto sobre GGR de 12% para 18% pressiona margens e alimenta articulações políticas do setor.
Sindibets/SP: o primeiro sindicato das apostas no Brasil
Convocada no Diário Oficial de 11 de julho, a assembleia de fundação do Sindibets/SP ocorrerá em 31 de julho de 2025, às 16h, no Itaim Bibi (com acesso remoto). Somente operadoras com sede ou atividade comprovada em São Paulo podem votar.
Na pauta: aprovação do estatuto, definição da base territorial estadual, eleição da primeira diretoria e regras de contribuição financeira. O registro sindical seguirá para cartório e Ministério do Trabalho a fim de garantir personalidade jurídica plena.
A comissão pró-sindicato reúne representantes de mercado: Ana Clara Marques (Sol Bet Serviços), Laura Morganti (Betboom) e Bárbara Teles (Stake Brasil). O grupo articula alinhamento com reguladores estaduais sobre fiscalização, publicidade, parâmetros técnicos e defesa contra mercado ilegal.
Por ser a primeira iniciativa sindical específica para apostas esportivas on-line e jogos digitais no país, o Sindibets/SP tem peso histórico. Empresas ligadas a verticais de cassinos online brasileiros acompanham de perto, avaliando replicar o modelo em outros estados ou aderir a uma futura federação nacional.
Por que agora? Os fatores que impulsionam a união das operadoras
Escala econômica: entre janeiro e março de 2025, estimativas do Banco Central debatidas na CPI das Bets indicaram fluxo mensal de R$20–30 bilhões em apostas digitais (legais + ilegais). Navegar esse volume requer coordenação técnica e política entre regulados.
Pressão fiscal: a alíquota sobre GGR pode subir de 12% para 18%, somando-se a contribuições obrigatórias (esporte, seguridade, segurança pública) e imposto sobre prêmios. A carga efetiva tende a ultrapassar 30% da receita operacional, cenário que incentiva negociação coletiva.
Custos de entrada: outorga de R$30 milhões, certificações, monitoramento de integridade e compliance tornam o ciclo de caixa pesado. Uniões setoriais podem pleitear fases de adaptação, abatimentos regionais ou escalonamento para novos entrantes.
Concorrência irregular: estudos indicam 41%–51% dos sites acessados no Brasil operando sem licença; 73% dos apostadores já usaram plataformas ilegais. Em ambientes clandestinos, 44% apostaram com cartão de crédito e 28% com cripto – práticas vetadas às licenciadas. A disparidade pressiona as legais a agir em bloco.
Representação política: debates sobre publicidade, bloqueio de domínios irregulares, proibição de crédito, tributação e padrões de jogo responsável avançam em Brasília e nas assembleias. Associações como ANJL e IBJR já firmaram cooperação; o Sindibets/SP adiciona a camada estadual. A ideia “Febrabet” surge como próximo degrau para integrar agendas e defender o mercado regulado brasileiro.
Uma federação nacional à vista? O debate sobre a Febrabet
A criação do Sindibets/SP reacendeu uma discussão antiga no setor: faz sentido ter uma representação unificada em nível nacional? A resposta parece se desenhar no horizonte com a possível criação da Febrabet — nome já usado informalmente nos bastidores da indústria para se referir à futura federação.
A ideia seria articular uma entidade que represente coletivamente tanto empresas de cassinos online brasileiros quanto de apostas esportivas on-line. O foco estaria em pressionar o governo federal contra mudanças agressivas, como o aumento da alíquota de 12% para 18% sobre o GGR — além de defender regras mais equilibradas de publicidade e licenciamento.
Outros objetivos incluem a promoção de práticas unificadas de jogo responsável, prevenção à lavagem de dinheiro e proteção de dados. A federação serviria também como ponte entre sindicatos estaduais (como o Sindibets/SP) e órgãos federais como a SPA — algo essencial num ambiente regulatório que muda o tempo todo.
Mas o caminho não é simples. O setor é heterogêneo, formado por gigantes globais e operadores locais. Alinhar interesses tão diversos exige governança clara. Também há o risco de sobreposição entre níveis — será que o Sindibets/SP aceitaria repassar parte da sua autonomia a uma federação nacional? Essas tensões podem travar o avanço da proposta por tempo indefinido.
O que está em jogo para o setor, o governo e os consumidores
Para os operadores, uma federação bem estruturada pode mudar tudo. Ao negociar em bloco, as empresas teriam mais força para propor soluções em vez de apenas reagir — como pleitear fases de transição regulatória ou evitar novos encargos que comprometam a margem das operações legais.
Para os reguladores, a vantagem seria ter um canal claro de interlocução. A SPA, por exemplo, já abriu consultas públicas sobre o andamento do mercado regulado. Uma entidade como a Febrabet poderia consolidar sugestões do setor, tornando o processo mais eficiente e técnico.
Os consumidores também têm o que ganhar. Um setor organizado tende a ser mais transparente. Medidas como autoexclusão padronizada, limites de apostas e campanhas educativas são mais viáveis com coordenação central. Isso fortalece a confiança do público nas plataformas autorizadas.
É claro que há riscos. Uma estrutura muito centralizada pode sufocar vozes menores — especialmente operadoras regionais ou especializadas. O desenho institucional precisará garantir equilíbrio: todos devem ter espaço, independentemente do porte ou localização.
Próximo nível: o que observar a partir de agora
O primeiro passo concreto já está em andamento com a assembleia marcada para 31 de julho, que deve oficializar o Sindibets/SP. O número de adesões e a postura inicial do sindicato serão indicativos claros do apetite por articulação institucional.
No plano nacional, a expectativa gira em torno de possíveis alianças. Entidades como ANJL e IBJR já assinaram acordos de cooperação, e essa união pode servir de base para algo maior — talvez até a formalização da própria Febrabet nos próximos meses.
O Congresso também entra em cena. A Medida Provisória que aumenta o imposto das bets será debatida em agosto. A forma como o setor se posicionar nesse processo — isoladamente ou por meio de uma voz coletiva — pode definir os rumos da representação sindical no mercado de apostas esportivas on-line e cassinos online brasileiros no Brasil.
Se a mobilização se confirmar, o país pode testemunhar a consolidação de um novo modelo institucional para o setor — mais profissional, mais transparente e, principalmente, mais influente nas decisões que moldarão seu futuro.